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Documentário narra ascensão e queda do Clube Avareense de Cinema

Dirigido por Amauri Albuquerque, “Uma História de Cinema” reconstitui trajetória do cineclube de Avaré e destaca sua importância para a cultura local

Flávio Mantovani

É difícil para a geração atual entender a importância que o cinema teve no século passado. Na sociedade digital, onde tudo está disponível na internet, basta um clique para assistir a qualquer filme.

Mas nem sempre foi assim. Antes do império das telas individuais (seu smartphone, no caso), houve um tempo em que os filmes só podiam ser vistos no cinema.

Estamos falando do período anterior à popularização da televisão, que só começa a entrar com mais força nos lares brasileiros a partir dos anos 60.

Até os anos 50, portanto, o cinema era o palco supremo onde a magia das imagens em movimento se materializava.

E bota magia nisso: foi puro deslumbramento desde o início. A invenção dos irmãos Lumière impressionou tanto que alguns jornais franceses postularam que o cinematógrafo representava a abolição da morte.

“Poderemos, por exemplo, rever nossos entes queridos por muito tempo, mesmo depois da morte deles”, escreveu o “Le Radical” após a exibição dos primeiros filmes em 1895.

Mas o cinema ia muito além. Terreno fértil para a fantasia, era uma janela aberta para o mundo, um recurso tecnológico que franqueava o acesso a tudo que havia de novo. E o melhor: sem que o espectador precisasse sair da poltrona.

Cineclubes

Uma manifestação efêmera, é verdade, com hora e lugar definidos. Quem viu, viu. Portanto, era preciso prolongar a experiência.

Foi assim que aficionados de todo o mundo começaram a se reunir em clubes onde cinéfilos projetavam películas, promoviam debates, ministravam cursos, produziam seu próprio material e divulgavam o que havia de novo na sétima arte.

O Chaplin Club, primeiro cineclube brasileiro fundado em 1928 no Rio de Janeiro, tinha até seu próprio jornal.

Avaré na vanguarda

Sempre atenta aos sinais dos tempos, Avaré é que não ia ficar pra trás. É nesse contexto que surge em março de 1956 o Clube Avareense de Cinema (CAC), cuja história acaba de ser reconstituída pelo documentário “Uma História de Cinema”, dirigido por Amauri Albuquerque com suporte técnico de Maú Bruno.

O Fora de Pauta participou da première para convidados realizada no sábado, 2 de setembro, no cinema particular do empresário e cinéfilo Cláudio Albuquerque.

Com imagens de arquivo e depoimentos de ex-integrantes ou de seus descendentes, o trabalho produzido pela Emncena Filmes retoma as origens do CAC pelas mãos dos pioneiros Carlos Eduardo Ferreira, Cid Ferreira, Ovídio Noronha, José Reis Filho, Joaquim Trench Silveira, Nelson Pala e João Bertolaccini.

Formação

“Uma História de Cinema” traz à tona uma entidade preocupada em aprofundar o conhecimento sobre a sétima arte.

O CAC mantinha biblioteca com livros técnicos, promovia seminários e levava associados para viagens técnicas em São Paulo. As diversas edições do “Curso de Iniciação e Cultura Cinematográfica” foram determinantes para o surgimento de novos cinéfilos em Avaré.

O trabalho de formação rendeu elogios de ninguém menos que o crítico de cinema Paulo Emílio Sales Gomes, um dos grandes ensaístas da área e figura central na fundação da Cinemateca Brasileira.

Integrantes que deram suas contribuições em diferentes fases do CAC também são lembrados no filme.

O diretor Amauri Albuquerque, o produtor Maú Bruno e o cinéfilo Cláudio Albuquerque (à frente) com convidados durante exibição do documentário

A derrocada

Com narração do cantor e compositor Juca Novaes, “Uma História de Cinema” aborda ainda o declínio do CAC, que fechou as portas em 2006 após um período de agonia pública.

Concorreram para sua derrocada as novas formas de consumo de produtos culturais, mudanças operadas pelos recursos tecnológicos que foram aparecendo ao longo das décadas (TV, videocassete e assim por diante).

Um adversário improvável também ajudou a jogar terra na cova do CAC: o estabelecimento do cinema comercial em Avaré.

Embora tivesse adotado a exibição de blockbusters como opção para aumentar a bilheteria, uma curiosa proibição diferenciava o CAC da concorrência: não era permitido o consumo de pipoca em seu interior. Por mais banal que pareça, a passagem ilustra bem a luta do cineclube para se colocar diante dos novos tempos.

O público foi minguando; a conta não fechava. Carlos dos Reis Carvalho, que dirigiu o CAC nos últimos 25 anos, chegou a tirar dinheiro do bolso para pagar as despesas.

O patrimônio do CAC – incluindo projetores e filmes sobre a história de Avaré – foi municipalizado. O prédio na Rua Rio de Janeiro passou a receber projetos da Secretaria Municipal da Cultura a partir de 2008, mas um novo golpe viria em 2013.

Após o trágico incêndio na Boate Kiss, o Corpo de Bombeiros passou a exigir AVCB, documento que atesta a segurança de espaços públicos. A adequação exigia um alto investimento, o que se mostrou inviável.

As portas se fecharam de novo, agora definitivamente. Apesar do triste fim, o documentário “Uma História de Cinema” deixa latente a importância do CAC para a cultura de Avaré.

Exibição pública

O diretor Amauri Albuquerque vai promover uma sessão aberta ao público no dia 30 de setembro, às 20 horas, na Estação das Artes (Rua Cel. Coutinho, nº 995, Brás II).

O documentário será disponibilizado no canal da Emncena Filmes no YouTube a partir de 1º de outubro.

“Uma História de Cinema” tem trilha sonora de Maú Bruno Damião com produção do músico Fernando Sanfa. O filme tem apoio do Mega Som Studios e EMME Estúdio. Confira abaixo o trailer do documentário.

 

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