Especial

Crônica : Sérgio Moro tá aí pra confirmar

“A verdade factual, esse cão sarnento desprezado por uma parcela da população, nunca tira o time de campo. É só olhar ao redor”

Flávio Mantovani 

A realidade começou a dar as caras. E ela não tem sido muito bonita nesses tempos de pandemia. Nem mesmo o grito tem superado a aspereza dos fatos. Estes são silenciosos, não esbanjam superioridade, nem mesmo um sorrisinho irônico, mas seguem resolutos na proposta de derrubar – um a um – nossos castelos de cartas.

A verdade factual, esse cão sarnento desprezado por uma parcela da população, nunca tira o time de campo. É só olhar ao redor.

O coronavírus transformou nosso cotidiano numa espécie de Chernobyl permanente, com o agravante de que não existe uma zona de exclusão: o risco pode estar em qualquer lugar. (A comparação é estúpida, eu sei: as vítimas do acidente nuclear na Ucrânia não tiveram a opção de se proteger, diferentemente de nós).

“Palavras dizem sim, fatos dizem não”. As vítimas da “gripezinha” começam a virar rostos familiares. Saímos do campo da abstração. Um conhecido que adoeceu; um colega de trabalho que perdeu um ente querido. Não lá longe, mas aqui do lado.

Os fatos, meu caro, não aceitam desaforo. O atleta que precisou ser entubado; um jovem sem comorbidades morto aos 27 anos.

A pandemia provou que não há fantasia política que resista à engrenagem da realidade. Mais dia, menos dia, a verdade factual arrebenta a escotilha quando quer colocar a cabeça pra fora. O Moro tá aí pra confirmar.

Epílogo
Encontrei um colega das antigas no mercado. A gente nem pôde se abraçar, uma pena. Trocamos apenas algumas palavras enquanto ele passava as compras no caixa, mas já foi o suficiente para ouvi-lo descascar o rosário.

Ele é do tipo que faz arminha com a mão e pede a volta da ditadura militar. Mas usava máscara. Disse que pregar contra o isolamento social era uma insanidade nas atuais circunstâncias e afirmou que não mandaria os filhos pra escola mesmo que as aulas voltassem amanhã.

Eu nem havia tocado no assunto, fiquei só ouvindo. Pensei até que ele estivesse sendo sarcástico, mas vi no fundo dos olhos dele uma sacola cheia de perplexidade.

A realidade não aceita desaforo.

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