Reportagens

Pracinha lembra passagens do conflito na Itália em documentário

Dificuldades vivenciadas durante combates em solo europeu são detalhadas no filme “Avareenses: Heróis de Guerra”, dirigido pelo cineasta Cláudio Albuquerque

FLÁVIO MANTOVANI

Um movimento brusco salvou a vida de Pedro Mariano da Silva durante uma batalha na Itália. O pracinha estava na trincheira quando um colega acionou acidentalmente uma granada. Se explodisse ali, o artefato mataria a todos. Pedro não teve dúvidas: deu um tapão na mão do soldado que segurava a bomba. “Ela caiu fora da valeta e ficamos cobertos de terra por causa da explosão”, relata o último dos combatentes avareenses, que morreu em abril de 2015.

Passado o susto, o avareense julgou pertinente uma nova intervenção, desta vez para salvar apenas a vida do soldado desastrado. “Queriam dar um tiro no sujeito. Eu falei que não”, conta Pedro Mariano, emocionado a ponto de interromper a narração.

Esta e outras passagens estão relatadas no documentário “Avareenses: Heróis de Guerra”, dirigido por Cláudio Albuquerque.

Privações

A apreensão e as privações começaram ainda no navio, antes mesmo da chegada à Itália. “Nós saímos do Brasil e os alemães começaram a acompanhar a embarcação. Acompanharam a viagem inteira. Quando o navio diminuía rotação, todo mundo saía e olhava para cima: eles vinham com o aviãozinho. E nós, de baixo, pensávamos: agora vem bomba”.

“Só tinha almoço, uma refeição ao dia. Depois eles davam duas laranjinhas para cada um. Eu descascava as laranjas e colocava a casca no bolso. Lá pelas nove horas da noite, mais ou menos, a fome apertava. Então eu comia a casca. Era a coisa mais gostosa do mundo”, rememora no vídeo.

Front

Dificuldades vivenciadas no cotidiano do front também são detalhadas no documentário. “Eu deixava o cantil com água dependurado no pezinho da cama baixinha que tínhamos. Quando era meia-noite, não tinha mais água, era pedra de gelo. Você chacoalhava e não chacoalhava. De tanto frio. A friagem era demais. Não podia acender cigarro. O inimigo estava por ali. Se você acendesse um cigarro, levava bala”, relatou.

Pedro Mariano também foi confrontado com um elemento corriqueiro numa guerra: a morte. “Foi coisa medonha. O sujeito caído dava a mão pra gente e falava: se você vir alguém da minha família, conte o que estou passando. Que família? O sujeito estava morrendo e pedindo para contar as coisas. Não é brincadeira não”.

O padecimento de civis também marcou profundamente o avareense. “O mais difícil era ver a criançada e não poder fazer nada. Você via o coitado do moleque já quase morto no campo. Isso era o mais duro. A gente nem conta tudo porque fica nervoso, né?”, confidencia na gravação.

Depois da vitória, os soldados derrotados chegavam em grupos e iam abandonando as armas em um monte. Após esse período, Pedro Mariano e os companheiros puderam percorrer de caminhão quase todo o território italiano e conhecer a Itália das mulheres bonitas. O passeio, no entanto, continuava pontuado por cenas impactantes. “O povo sem ter o que comer. Isso era o mais difícil de se ver”, lamenta o avareense.

Sequelas

Mesmo com o fim do conflito e o retorno para a casa, a sombra da guerra perseguiria Pedro Mariano por toda a vida. Já idoso, ele passou a evitar o assunto. “Você fica com aquilo na cabeça. Sabe quantos anos para eu levei para endireitar? Dez anos”, revela.

Fonte: Jornal A Comarca.

Um comentário sobre “Pracinha lembra passagens do conflito na Itália em documentário

  • O Brasil entrou na guerra forçadamente e enviou soldados que não tinham a mínima ideia do que iriam encontrar nos campos italianos, mas brasileiro, mesmo com a gravidade do episódio, soube se adaptar e com inteligência impressionar até os arrogantes americanos. Histórias individuais de conterrâneos como essa nos enriquecem por um lado e entristece por outro.

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