Djanira, vida e arte em quadrinhos
Obra que conta em HQ a trajetória da mais importante pintora avareense é parceria com outro artista notável, o premiado quadrinista Luiz Carlos Fernandes
Gesiel Júnior*
Especial para o Fora de Pauta
“Talvez– declarei no ano 2000 e repito agora – seja ousadia afirmar que consegui, apoiado pelo consórcio de autores amigos, escrever sobre a mulher mais importante da história avareense. Refiro-me à pintora Djanira. Do plástico Brasil moderno ela é a singular representante. A sua arte, genuína, plena de cores e de traços simplificados, ainda não foi devidamente conhecida, valorizada e reconhecida pelos homens do nosso tempo. Coisas de um país desmemoriado e com tão poucos vestígios da própria cultura”.
Tais considerações as fiz na apresentação do livro “História de Djanira brasileira de Avaré”, a primeira biografia da artista, que publiquei pela Editora Arcádia há 18 anos. Com efeito, em 2004, convidado, escrevi “Contando a arte de Djanira”, volume integrante de uma coleção da Editora Noovha América.
Em 2014, embora tenha me faltado apoio cultural – sobretudo da Prefeitura de Avaré, a qual teoricamente compete o dever de incentivar o cultivo da memória da grande artista entre o seu povo – consegui, entretanto, graças ao patrocínio da Unimed/Avaré, lançar “Djanira para conhecer e colorir”, uma coletânea de desenhos da pintora destinada ao público infantil, mas muito curtida pelos adultos.
Assim foi possível homenagear singelamente o centenário de nascimento da genial pintora avareense, primeira latino-americana a ter uma tela no acervo da Pinacoteca do Vaticano.
Sobre o quarto livro
Preparo-me, feliz, para o lançamento da quarta obra impressa para honrar a memória de Djanira. Incentivada pela Secretaria de Estado da Cultura através do ProAc, a produção dessa iniciativa teve uma parceria especial: a de outro artista notável, o premiado quadrinista avareense Luiz Carlos Fernandes. Ele me enredou nesse belo projeto e a ele agradeço pelo honroso convite para escrever o roteiro do livro.
A propósito, os desenhos de Fernandes, primorosos, ressuscitaram Djanira, a ponto de a saga da pintora causar-nos encanto e espanto, ao mesmo tempo. Sim, pois muita gente ainda desconhece a trama daquela que regeu com o seu iluminado pincel uma sinfonia de cores em louvor à cultura brasileira.
Orfã de pais vivos, resgatada pela avó materna, a menina que viveu períodos épicos da vida nacional – como a Coluna Prestes e a Revolução de 1932 – emancipou-se em São Paulo, perdeu a graça da maternidade, venceu a tuberculose e, em meio a tantas dores, cores, amores e humores, se revelou artista no morro de Santa Teresa, no Rio.
Com efeito, este nosso novo livro conta isso tudo em quadrinhos. Mostra Djanira boia-fria, costureira, empreendedora e combativa num mundo em guerra. No contexto, aliás, Fernandes quis lembrar justamente de um quase desconhecido herói avareense: o soldado Sérgio Bernardino, patrício da artista, morto combatendo o nazismo nos campos da Itália.
Outra figura legendária, cujos versos louvaram a amiga pintora, por mérito reaparece também nestas páginas: a poetisa Anita Ferreira De Maria. Portanto, gente de Avaré desponta entre as impressionantes criações de Fernandes para pictoricamente tornar rediviva a sua artista conterrânea.
Abandonada, dolorida, desprezada, resolvida, empenhada, perseguida, premiada, querida e, enfim, merecidamente consagrada. Assim a história de Djanira em quadrinhos a mostra em sucessivas ilustrações, ora alegres, ora até mesmo plangentes.
Parabenizo Fernandes por ter convertido tão singelo roteiro numa obra artística incomparável, digna da nossa biografada. Em traços líricos esta HQ – a meu ver – refaz a passagem multicolorida de Djanira entre nós.Viva!
*Gesiel Júnior, 54, cronista e pesquisador, é biógrafo da pintora Djanira da Motta e Silva