Casal transforma tragédia pessoal em projeto que doa brinquedos a crianças carentes
Eduardo e Cláudia, que perderam filho após atropelamento em 2014, converteram dor em causa social
Chico Sant’Anna
Para olhares desavisados, Eduardo Henrique Batista de Oliveira, funcionário público estadual, e Cláudia Regina Mantovani de Oliveira, professora municipal, são pessoas comuns.
No entanto, o casal é responsável por uma iniciativa gratificante dentro da sociedade avareense: a família recupera e doa brinquedos para crianças de localidades carentes de Avaré e cidades próximas. A ideia surgiu como forma de aplacar a dor de uma perda irreparável que se abateu sob a vida dos envolvidos.
Tudo começou em janeiro de 2018, quando Eduardo e Cláudia presenciaram uma doação de brinquedos feita por um grupo assistencial da cidade de Araxá (MG) para a Colônia Espírita Fraternidade.
O casal, aliás, integra o coral da entidade avareense desde a perda do filho caçula, Eduardo Filho, em um atropelamento culposo registrado pouco antes do Natal de 2014.
Após se recuperar psicologicamente, eles resolveram atuar de alguma maneira para dar uma melhoria na situação de vida de quem necessita. Escolheram, por aproximação, beneficiar crianças carentes cujos pais não dispunham de recurso para adquirir brinquedos.
A partir disso, Cláudia e Eduardo, juntamente com outros três filhos, passaram a recuperar brinquedos obtidos junto ao grupo mineiro e também com avareenses.
Aos poucos, o montante foi ganhando vulto e enchendo quartos da casa da família localizada no Bairro Santa Elizabeth. Quando deram por si, eles se viram obrigados a deixar o espaço e se mudaram para uma residência na área da Represa Jurumirim.
O nome para a iniciativa, no entanto, não surgiu imediatamente. “Uma amiga e colaboradora nos presenteou com um banner com a foto do nosso filho e o título Oficina de Brinquedos “Eduardo Filho”. No primeiro momento, ficamos meio apreensivos, pois não queríamos que pensassem estarmos nos valendo de nossa dor para autopromoção. Porém, a recepção ao nome não teve recusas por parte da sociedade”, destacou Eduardo.
Ações iniciais
A primeira doação pública de brinquedos aconteceu no dia 16 de dezembro do ano passado, em uma ação pensada para atingir, inicialmente, as crianças da Escola Municipal “Prof. Carlos Papa”.
Além de brinquedos, a campanha conseguiu agregar outros parceiros na doação de sorvete, cachorro quente e brinquedos infláveis.
A data marcou os quatro anos do acontecimento trágico no centro da cidade. Aproximadamente 100 pessoas participaram da iniciativa.
“Porém, sobrou muita coisa. Resolvemos, então, ampliar nosso raio de ação e doamos para as crianças de um bairro carente da cidade de Tejupá e de Taquarituba”, destacou o realizador.
Estimativas de Eduardo apontam que, nesse ano, a campanha deve doar mais de 1.500 unidades. “Pretendemos, até mesmo, entregar bicicletas usadas que recebemos que, com apoio da Mendes Bike, do empresário Maurício Mendes, serão consertadas até o prazo final”. Até o momento, o grupo já contabiliza 25 bicicletas que aguardam recuperação.
Apoio variado
Além de doar itens para comunidades da região, eles também promoveram, de forma improvisada, uma festa com as crianças do Bairro Mário Bannwart.
“Fomos em três carros até aquela comunidade. Você precisava ver a criançada correndo pra pegar os brinquedos. Foi interessante por não ter sido nada programado: nós pegamos tudo e saímos sem rumo, apenas sabendo que íamos auxiliar várias pessoas”, disse Cláudia.
O casal destaca o surgimento, no início da ideia, de pessoas interessadas em ‘lucrar’ de alguma forma com a iniciativa. “Não queremos nada dos chamados ‘políticos’: se quiserem nos ajudar, que sejam bem-vindos, mas sem nenhuma espécie de moeda de troca”.
Cotidiano
Antes de sair às ruas, a família, com apoio dos voluntários, continua sua rotina constante: avaliar os brinquedos doados, consertá-los e deixar tudo pré-estabelecido para o evento do final de ano.
A casa, aliás, é um grande depósito dos mais variados tipos de brinquedos, de pequenos jogos para montar até grandes bonecas.
“Distraio meu pensamento fazendo roupinhas para as bonecas, limpando outros brinquedos, encaixotando. Desta maneira, conseguimos coordenar as ações e evitar que a tristeza nos abata de forma mais severa”, frisou a mãe.
Futuro
Agora eles pretendem guardar brinquedos específicos para montar futuramente uma espécie de brinquedoteca. O local, conforme intenções da dupla, servirá para que crianças possam ficar durante o dia enquanto suas mães trabalham, como uma creche.
“Não podemos fazer isso agora por eu ser professora e o Eduardo, agente penitenciário”, diz a professora.
Para tanto, a ideia é cobrir o primeiro andar do sobrado, transformando a área em um barracão para acondicionar a maior quantidade possível de doações.
“Isso ainda vai demorar, mas falta pouco para eu me aposentar. Quando isso acontecer, pretendo ampliar nosso espaço com a utilização de mais prateleiras de aço, além de priorizar, desde janeiro, os itens para a realização da distribuição, que acontece perto das festas de final de ano”, frisou.
Em sua visão, as atividades lúdicas são imprescindíveis na formação de novos seres humanos. “Como trabalho em uma escola, entendo que o brincar auxilia muito no aprendizado da criança. Apesar disso, percebemos que muitos pais não têm condições de dar roupas e alimentação suas crianças, o que dizer de brinquedos. Essa foi uma maneira que achamos, já que não podemos dar para o nosso filho”, continua Cláudia.
As doações podem ser feitas diretamente no imóvel em que funciona a Oficina de Brinquedos Eduardo Filho, localizado à Rua Luiz Fagnani, números 72 e 81, no Bairro Santa Elizabeth.